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Chuva deixa 501 cidades mineiras em risco

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Vulneráveis às fortes tempestades que os atingem no período chuvoso (outubro a março), 501 municípios mineiros (59% do estado) estão dentro da mancha de exposição muito alta ou crítica a chuvas intensas. As informações são do Jornal EM.
As precipitações volumosas começam com a chegada do mês de novembro, quando historicamente chove em todo território mineiro entre 100 milí- metros (mm) e 250mm – outubro fica entre 100mm e 180mm –, provocando enchentes, enxurradas e deslizamentos. Segundo o Índice Mineiro de Vulnerabilidade Climática (IMVC) da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Semad), 176 (21%) municípios têm o grau mais dramático de fragilidade.
O pesadelo de rios transbordando e invadindo casas está presente em 49 cidades com mais de 50 mil habitantes, onde, de acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), 9% das residências, em média, encontram-se em áreas com alto risco de alagamentos.

Só na Grande BH, são nove municípios de mais de 50 mil habitantes com média de 8,3% das residências em áreas de ameaça de inundação (Belo Horizonte, Contagem, Ibirité, Lagoa Santa, Nova Lima, Pedro Leopoldo, Sabará, Santa Luzia e Vespasiano).
Sabará figura como destaque negativo em Minas Gerais nas duas listas de fragilidade do período chuvoso. É um dos 176 municípios mais expostos a chuvas, com períodos de mais de cinco dias concentrando a partir de 180mm de precipitações com recorrência de 20 anos. Para se ter ideia, se esse volume de água ficasse represado em um campo de futebol (110m x 75m), daria para encher 1.485 caixas d’água de mil litros ou 297 caminhões-pipa pequenos, de 5 mil litros de capacidade. (Veja mais comparações sobre volumes de chuva no quadro ao lado.)
Sabará é também a cidade mineira com mais de 50 mil habitantes onde a maior parcela das residências está contida dentro de áreas de inundações. De acordo com o SNIS, o percentual chega a 28,7% dos domicílios existentes. No ano passado, após o maior registro de todos os tempos de precipitações em um só dia, com a Grande BH recebendo mais de 170mm de chuvas entre a noite do dia 23 de janeiro e a madrugada de 24, cerca de 500 pessoas ficaram desalojadas quando suas casas foram invadidas pelas águas da cheia do Rio das Velhas, em Sabará. Uma pessoa morreu.
O mês de outubro em Sabará já registrou 48 ocorrências relacionadas às chuvas, como deslizamentos, enxurradas, desabamentos de muros, quedas de árvores e inundações, segundo a Defesa Civil municipal. E a franqueza do coordenador de Defesa Civil de Sabará, Elias Magalhães, não traz muito alento aos que já foram atingidos pelas chuvas passadas, tiveram de deixar suas casas e perdem o sono toda vez que os céus escurecem sobre o Rio das Velhas. “Formamos uma boa rede de assistência social de 2020 para cá, conseguimos fazer sistemas de captação de água da chuva e drenagens, mas não temos nenhuma condição de enfrentar novamente uma chuva como a de janeiro do ano passado. Estamos prontos, mas para situações normais”, disse.
O coordenador ainda afirma que os informes meteorológicos não têm conseguido dar prazo suficiente para que ações preventivas e emergenciais possam ser tomadas com mais efetividade. “A meteorologia não está conseguindo nos dar alertas com uma antecedência mais prática, de quatro ou cinco dias. Nos avisaram com 50 minutos das últimas vezes. Resta-nos uma margem de resposta muito pequena. A cidade tem relevo alto e embaixo é planície, com os rios e casas. Quando essa água vem de cima é rápida, não tem onde escoar e acaba enchendo os rios e inundando as casas rapidamente”, afirma Magalhães.
Drama dos moradores O padeiro Jorge Emiliano, de 54 anos, conhece o poder destrutivo do Rio das Velhas e do Ribeirão Sabará quando a chuva engrossa e ocorrem transbordamentos. “Já perdi móveis e eletrodomésticos quando a água entrou dentro de casa. Ficou tudo debaixo de mais de meio metro de água barrenta. Tive de sair correndo com a minha mulher e os filhos, só salvamos uma mochila de roupas e a nossa cachorrinha. Como nada tem sido feito para evitar isso, me mudei para um lote mais acima, vamos ver se ainda assim a água não entra. Só rezando mesmo”, conta.

O comerciante Aldair Arantes de Souza, de 56, tem um armazém em uma das áreas de baixada mais próximas ao Rio das Velhas e por isso já viu seu imóvel submerso em 1,80 metro de água em algumas tempestades. “Muitas mercadorias minhas se perderam. Alguma coisa a gente conseguiu salvar, mas de prejuízo só com mercadorias foram mais de R$ 10 mil. Isso sem falar que levamos 10 dias para limpar todo o barro sem a ajuda da prefeitura nem da Defesa Civil”, afirma. Para ele, um dos problemas da sua região é que os pilares das pontes sobre o rio acumulam lixo e troncos de árvores, desviando uma enxurrada diretamente para as ruas.
BR-381 interditada As fortes chuvas na Região Leste de Minas, nos vales do Aço e Rio Doce, provocaram na manhã de ontem a interdição da BR-381 em dois pontos, impedindo a passagem de veículos no trecho próximo a São Joaquim da Bocaina, por causa do deslizamento de uma barreira. Um dos dois trechos interditados, em direção a Vitória (ES), foi liberado à tarde. A liberação ocorreu no Km 273, que fica na altura da cidade de Jaguaraçu.
A outra interdição, no Km 263, área urbana de Timóteo, causada por duas rochas que rolaram do alto das encostas e continuam nas pistas, no entanto se mantém. A região fica nos vales do Rio Doce e do Aço.  O trânsito está fechado e não há previsão de ser liberado. Há risco de novos deslizamentos e, com isso, mais rochas despencarem das encostas.

Falta estrutura contra desastres

A vulnerabilidade contra chuvas intensas abrange 59% do estado e esse mesmo percentual, compreendendo 510 municípios, também engloba a ausência ou presença muito tímida de estruturas de adaptação e combate a desastres, segundo o Índice Mineiro de Vulnerabilidade Climática (IMVC) da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Semad). O nível de despreparo dentro do IMVC é refletido pelo Índice de Institucionalização de Gestão de Desastres, que considera a “presença de estrutura física, pessoal treinado, bem como o uso dos instrumentos de gestão adequados denotam o grau de preparo dos municípios para atuar em prevenção e resposta a desastres”.

Dentro desse indicador, 409 cidades têm estrutura muito ruim e 101 virtualmente não dispõem desses aparatos. Entre as estruturas necessárias para julgar a preparação das comunidades, leva-se em consideração a presença de Coordenadoria Municipal de Proteção e Defesa Civil (Compdec), existência de Plano de Contingência, presença de Núcleos Comunitários de Proteção e Defesa Civil (Nupdecs) em número recomendado, e Coordenador Municipal em Plano de Defesa Civil treinado nos últimos 5 anos.

Nas cidades mais densamente povoadas de Minas há situações onde as chuvas disparam riscos severos para famílias que habitam várzeas alagáveis e encostas instáveis. Soluções de engenharia para conter a água, reforço dos barrancos e a remoção das habitações são ferramentas que podem levar a soluções do ponto de vista técnico, mas, para o professor de engenharia hidráulica Luiz Rafael Palmier, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o componente mais importante é a avaliação sobre os riscos de que alguém possa morrer. “Em situação de risco muito elevado, de risco iminente de acidentes com perdas de vida, não há dúvidas de que as pessoas têm que ser removidas”, afirma.

O especialista considera essa uma questão de difícil resolução quando essa variável não é tão clara. “Nos casos da ocupação de áreas de risco, não se pode culpar a vítima, que é a população que lá reside. É claro que o ideal seria ter áreas vulneráveis não habitadas. Do ponto de vista só da engenharia, com obras muito complexas e muito onerosas é possível diminuir o risco da ocupação de áreas vulneráveis. Claro que a situação é diferente quando da criação, por exemplo, de parques lineares, pois o processo de deslocamento das pessoas tem condições de ser realizado com forte consenso participativo”, observa Palmier.
Ações De acordo com a Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (Seinfra-MG), estão programadas ações de contenção de encostas previstas para 18 municípios mineiros em que foram identificadas áreas de risco, totalizando cerca de R$ 111 milhões de investimentos. “Sabará é um dos municípios a serem beneficiados, com investimentos na ordem de R$ 7 milhões. No momento, os projetos encontram-se em fase de aprovação junto à Caixa, uma vez que as ações contam com recursos federais.” A secretaria informou que tem programa de doação de materiais metálicos para obras de infraestrutura municipal (vigas para pontes e bueiros metálicos), comprocedimento simplificado de entrega para aquelas intervenções em municípios decorrentes de danos provocados pelas chuvas.

Problemas

O volume de chuvas em Minas Gerais gerou um alerta inédito neste semestre: o de grande perigo para o acumulado de água. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) aponta que 272 cidades mineiras correm grandes riscos por causa da chuva, que não para desde o começo da semana. São municípios do Triângulo, Centro, Sul, Noroeste e Vale do Jequitinhonha que estão em risco. Há também grande probabilidade de deslizamentos de terra, desmoronamentos, quedas de energia elétrica e queda de árvores. Não há previsão, porém, de ventos em grandes velocidades. O acumulado de água nessas regiões pode ultrapassar 100mm nas próximas horas. A “culpa” dessa chuvarada toda é da Zona de Convergência do Atlântico Sul, um fenômeno meteorológico que é comum nesta época do ano, mas que em 2021 veio mais intenso. São nuvens que se formam na região amazônica e ‘descem’ pelo país, estacionando no continente, bem onde fica Minas.
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